quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Ópera

Ontem de noite enquanto corria me vi transportada pelo som das ondas na lagoa. Impulsionadas pelo vento, chocavam-se contra a estrutura de concreto que formava sua orla. Ao fechar os olhos, percebi minha audição ampliada e me vi perdida no meio do mar, respirando o ar fresco, até gelado, da noite implacável dos pescadores. 
Lembrei-me de Tengo, Aomame e lembrei da liberdade de poder refletir sobre as sensações e analisar meu cenário em volta. É como se retirasse uma pequena película, fina e turva, que bloqueasse a visão, porém não totalmente. É como a diferença tão batida entre enxergar e ver.
 Acordei antes do despertador, pela primeira vez depois de muito tempo. E o corpo não estava pesado e sonolento. A temperatura estava boa e o sol radiante. Como era cedo, me permiti permanecer deitada, desfrutar do conforto e sonhar acordada.
Ao me aprontar, me senti disposta e alegre para enfrentar o dia. Momento tão raro ultimamente. No carro, escolhi música clássica quando me lembrei do passado. Costumava sintonizar a estação de rádio que tocava óperas variadas, deitar no sofá e fechar os olhinhos. Acredito que eu tinha mais ou menos quatorze anos naquela época. Era tão bom poder parar o mundo por um tempo, não ter nenhum problema martelando a mente. Sentir os acordes deslizarem pelo corpo todo. Respirar a harmonia perfeita entre os instrumentos e perceber cada detalhe da composição. Tudo bem que hoje estava dirigindo, e a atenção jamais seria exclusiva. No entanto, a paz nostálgica que me atingiu foi intensa. 
Ainda tenho facilidade para escrever e me expressar, mas tão pouco sobre o que falar. A vida não está como eu gostaria, então me perco em vidas de tinta, espalhadas em páginas que não me pertencem.
Contudo, sigo. Me nutrindo da força que aqueles que me amam me doam sem pensar duas vezes.
Talvez, se eu fosse mais só, estaria tudo perdido.